OS MAPAS DO TESOURO
Subimos e descemos montes e vales, sempre
em busca dos tesouros perdidos entre a névoa da manhã e o circular vertiginoso
pelos itinerários principais em direcção às cidades interiores. As novas
rodovias são um descanso para os olhos que, assim, podem tactear mais
facilmente a paisagem, percorrendo-a, palmo a palmo, em busca de um lugar onde
as mãos possam disfarçar o frio que sempre as entristece.
Descemos até à barragem e contornámos a
albufeira para, depois, nos perdermos no silêncio de quilómetros de uma mata
escura onde, como dedos, os troncos dos pinheiros sobressaíam, soberbos, por entre a neblina que a aragem da serra começava a
dissipar. O sol da manhã já queria aquecer as cores do fim do Outono, mas as
mãos, essas, ainda hesitavam entre o silêncio e o calor que as envolvia. Até
que sossegaram no lugar justo, enquanto a manhã se aproximava do fim. Aí
permaneceram até que as nuvens da tarde, acasteladas num horizonte cinzento
para os lados do poente, anteciparam o regresso da chuva e da saudade. Saudade
de tudo. Por isso seguimos viagem contornando sempre a água que marejava os
olhos, como se contornássemos uma albufeira de sensações, até que, por fim,
vimos as próprias sensações elevar-se da aquática miragem e inundar o rosto
todo.
Que ilhas de esperança poderemos descobrir
por entre a neblina que se dissipa a montante e a jusante desta barragem? Que
líquido prazer é este de viajar, sem rumo, pelas estradas marítimas dos nossos
anseios? Que tesouros se escondem na palma das mãos, quando estas desenham, de
cor, nos mapas imaginários da memória, as rotas das grandes viagens à volta de
nós mesmos?
Augusto Mota, texto 93 de «A Geografia do Prazer», 1999
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