Os olhos viajam sozinhos pelos caminhos da
serra, enquanto a tarde vai diluindo a paisagem no horizonte longínquo, para lá
do rio que nos atravessa o corpo e das pontes que atravessam o rio. Pelas rotas
do cársico remamos, então, sem destino, ao sabor do tempo que escorre lento
pelas aldeias sombreadas do vale. Umas vezes passamos sob as pontes que ligam o passado e o futuro. Outras, passamos
sobre aquelas que nos levam ao encontro do presente. Mas em todas navegamos,
como se a água fosse a via certa para esta memória do presente.
Cruzando pontes, navegamos recordações.
Cruzando recordações, lançamos pontes através dos espaços vazios entre os
dedos, quando estes só servem para contar as horas que sobram para a viagem de
regresso.
Augusto Mota, texto 100 de «A Geografia do Prazer», 2000
- Exaltação do corpo em viagem pelos continentes da memória.
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